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Reflexões vazias (ou cheias...) que até podem levar a algum lugar. No fundo, apenas quero saber bem mais que meus 40 e poucos anos.

Rufus/Male/. Lives in Brazil/Goiânia/, speaks Portuguese and French. Spends 20% of daytime online. Uses a Fast (128k-512k) connection. And likes Music/More Music.
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Rufus: quase humano.
segunda-feira, janeiro 05, 2004
Lavando a alma.
Tão pensando o quê?? Rufus também escreve continhos, pombas!!
Saquem só:


LAVANDO A ALMA

(terça-feira, 11 de janeiro de 2000)


Foi para a cozinha, pegou do sabão e da esponja e começou a lavar a louça. E nunca mais parou.
A mulher, cansada e um pouco doente, insistira pouco antes:
— Você nunca lava a louça para mim...
— Faço qualquer coisa, querida, menos isso.
— Bobagem. Todo homem ajuda sua mulher. Vai lá, vai? Estou tão cansada e a cozinha está um verdadeiro lixo...
Não se sabe por que, dizem que ele respirou fundo e, num átimo, sem menos nem mais, pegou do detergente e da esponja e começou a lavar a louça. E nunca mais parou.
A esposa, intrigada com a demora do marido na cozinha, resolveu verificar. A cena foi inesquecível: absorto, impassível, totalmente imerso naquela atividade cotidiana e contumaz para tantas donas de casa, seu semblante irradiava aquela luz da qual só conhecem os sábios e os místicos. Verdadeira criança maravilhada com a primeira vista do mar, o primeiro passeio no parque de diversões, a primeira ida ao cinema, a emoção do primeiro brinquedo.
— Juvêncio, o que é isso? Faz horas que você aí está, homem! Não temos tanta louça assim!
— Não sei, me deu uma coisa... Por que você não me disse antes que era assim? É tão bom, tão agradável, tão... tão...
— Tão o quê, homem de Deus?!
— Tão mágico lavar a louça. Já é a terceira vez que lavo tudo de novo. Acho que nunca mais vou parar... Parece... parece que a gente lava a alma, lava o corpo, lava o espírito... nem sinto os pés no chão...
— Era só o que me faltava...
O certo é que Ruth nem imaginava como a vida de seu marido iria mudar. No início, nem estranhara quando este chegava do trabalho e já perguntava à família: "sujaram muitos pratinhos para o papai lavar?" Mal almoçava ou jantava: estava mais preocupado em lavar pratos, copos, panelas e talhares. Chegava a implorar para que os filhos repetissem o prato, para que pudesse lavá-los de novo.
— Ô, pai, assim já é demais! E o meu regime?
— Não esquenta. Depois eu te pagou uma semana num spa. E vou junto para lavar a louça de todo mundo!
Ruth e os filhos só perceberam a gravidade do fato quando o marido começou a distribuir panfletos pela vizinhança: "Lava-se louça de qualquer tipo e tamanho. Preços módicos. Na verdade, quase de graça".
Se mais alguém estranhou? TODO mundo, minha senhora. A começar pelo pessoal da repartição. Já nem tocava em questões técnicas do escritório: discursava horas a fio sobre as qualidades miraculosas de se lavar louça. Receitava técnicas de lavagem, "para evitar a LER, sabe? Muitas donas de casa lavam o prato segurando-o com mão esquerda apenas, sem apoiá-lo na pia. Que perigo!". Indicava as melhores marcas de detergente, o melhor horário para tocar na louça suja — "Após o jantar. É reconfortante!"
Não demorou muito e a mulher entendeu o novo ofício (ou mania, ou vício, ou tudo isso junto, sabe-se Deus...) como a mais completa indiferença pela mesma. Daí à intimação foi um pulo:
— Ou a louça ou eu!
— Desculpe, querida, mas é algo incontrolável...
— Então, RUA!
Saiu de casa, enfim. E foi morar num quartinho em cima de uma pizzaria. De quebra, começou a fazer horas-extra ali, lavando pratos até tarde da noite...
Dormindo pouco, atrasando-se constantemente para o trabalho, acabou sendo chamado pela direção.
— Sr. Juvêncio, nós, aqui na firma, estamos cientes de seu... ehr... sua fixação por lavar pratos, e entendemos que isto vem prejudicando não só a você, como ao próprio escritório. Pedimos encarecidamente que o sr. pare com essa atividade paralela, para seu próprio bem.
— Jamais! Prefiro a morte!!
— Você não tem sonhos, ambições? Pretende lavar louças a vida toda?
— Sim, doutor. Sinto que nasci para isso.
— Que assim seja, então...
Fora do escritório, seu primeiro emprego foi numa lanchonete. Realizou-se por completo, lavando louças e mais louças monumentais. Era o primeiro a chegar e o último a sair. Nos finais de semana, participava de almoços e jantares de caridade, prontificando-se a lavar toda louça que surgisse na ocasião. Chegou mesmo a ganhar uma menção honrosa do próprio prefeito, por serviços prestados à causa solidária.
Da última vez que se ouviu falar dele, estava pela Austrália, participando de um concurso maluco de melhor e mais eficiente lavador de pratos do mundo.
Dizem os mais afoitos que ele ganhou o primeiro prêmio por unanimidade...


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